Ricardo Scofano Medeiros
Doutorando PPGE - UFRJ
De agora em diante, não há um orador nem mediador únicos. Não há um mestre sem contramestre. Não há univocidade. Cada um pode exprimir-se na sua própria língua e os destinatários dessas palavras podem recebê-las na sua. Depois de desatados os nós, restará apenas uma imensa linha. (MBEMBE, 2013, p. 20)
O que pode emergir de uma roda de conversa com professoras e professores? E bem no meio dessas conversas, quais falas ouvimos e quais outras devém imperceptíveis? Como captar, naquilo que é menor, notas de uma política curricular irreplicável, não reproduzível, singular; ou que, em outras palavras, interroga fundamentos pré-estabelecidos que garantiriam e sustentariam, assim dizendo, a fórmula de uma escolarização bem-sucedida? Sugiro, com o título desse breve relato e a incipiente problematização realizada, que muito antes de um currículo passar por toda uma rede, é uma rede que compõe, diferencialmente, um currículo.
A inspiração do argumento é tributária dos estudos nos/dos/com o cotidiano, no entanto, o que o contato junto à rede municipal de Niterói apresenta vai além: uma rede não se limita aos seus próprios contornos, não pode ser vista como autocontida, transparente, isso porque há muitas redes dentro de uma rede, formando, então, um inesgotável emaranhado de linhas de forças formadoras de diferentes modos de existência.
Em um cenário notoriamente fértil para ecoar as mais diversas inquietações, estabelecer um conversa atenta com os professores e professoras da rede niteroiense é uma maneira sútil, mas não menos disruptiva, de contribuir com o esgarçamento de discursos que insistentemente procuram operar dicotomias que reservam, ao docente, o lugar de um burocrata que tem por função seguir determinado script, por que não currículo, previamente planejado. É nessa perspectiva que percebo, com alegria, que as tensões entre o que conta como currículo na hora de fazer política, e o que conta como política na hora de se fazer currículo, perdem espaço, nas falas das rodas de conversa, para outra afirmação: fazer currículo é fazer política.
Para retornar à citação que abre esse pequeno texto, quando o assunto é currículo, não há univocidade. E, se assim o é, é porque os nós que separam a atividade docente de uma atividade política foram desatados. Como diferentes autores e autoras nos fazem pensar, não há univocidade porque o antagonismo é constitutivo do campo político – fazer currículo, por suposição, não pode estar imune aos processos de disputa que buscam significa-lo de acordo com as mais diferentes vontades e intenções.
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